domingo, 20 de maio de 2018

Retalhos da história - "Os ruídos de umas termas"

Inserido no tema do "Festival Beja Romana", que teve lugar este fim de semana na cidade de Beja, a atividade "Retalhos da história" inclui um texto sobre alguns aspetos da vida quotidiana dos romanos, bem como algumas curiosidades sobre a contagem do tempo.
Lembramos que as termas romanas foram bastante importantes na história da civilização Romana. Isto porque, para além de serem o mais importante ponto de encontro para o convívio entre os cidadãos, serviam também como local de descontração e relaxamento promovendo o convívio social e politico.

Assim, convidamos-te a ler os textos que se seguem:


"O ruído de umas termas "

Imagina todas as espécies de vozes. Enquanto os desportistas treinam e se exercitam nos alteres, ouço gemidos; de cada vez retomam o fôlego, segue-se um silvo e uma respiração aguda. (...) Acrescente-se ainda o quezilento, e o ladrão apanhado em flagrante, e o homem que se diverte a ouvir a sua própria voz enquanto toma banho. Juntem-se a tudo isto as pessoas que saltam para a piscina salpicando os outros de água. 

Mas todas estas pessoas têm uma voz normal. Agora imagina a voz aguda e estridente dos depiladores que de repente dão gritos, sem nunca se calarem, a não ser quando depilam as axilas aos outros, obrigando-os, então, a gritar por sua vez. 

Há ainda os gritos variados dos pasteleiros, vendedores de salsichas e de patés e de todos os moços de taberna que anunciam as suas mercadorias numa melopeia característica. 

Séneca, Cartas a Lucílio (Séc. I d.C.) 

Imagem ilustrativa - 1. Reconstituição de termas romanas.

Imagem ilustrativas - 2. Ruínas das termas da Villa Romana de Pisões, Beja

Como se frequentava as termas? 

Em que consistia a visita termal? O banhista entrava no edifício e despia-se no apodyteruim, um vestiário onde normalmente existiam bancos e armários, ou nichos na parede, aí guardando as suas roupas e pertences pessoais. Depois era friccionado com óleos perfumados, para de seguida praticar alguns exercícios, se assim desejasse, e estava o banhista pronto para embarcar no processo termal propriamente dito. Ele teria várias escolhas à sua disposição. O percurso mais comum com a visita à sala tépida, o tepidarium, onde teria de calçar umas sandálias de madeira para não queimar os pés. Deste ambiente passaria para a sala mais quente, o caldarium, retornando à sala tépida e transitando para a sala fria, o frigidarium. Neste percurso podia o banhista integrar outras ações, dependendo da dimensão e luxo do edifício termal, mas também do seu gosto pessoal. Por exemplo, poderia optar por visitar a sauna (sudatorium) ou tomar um banho de imersão nas banheiras de água quente (os alvei) situadas no caldarium, ou, se assim o permitisse o estabelecimento, nadar na piscina exterior, a natatio. Durante este processo, e possivelmente no tepidarium, o banhista era «raspado» com um strigilis, uma espécie de espátula em forma de gancho que servia para retirar o óleo e as sujidades do corpo. 

Note-se que na época romana não se conhecia o sabão. Para lavar o corpo utilizavam-se óleos perfumados. A ordem e o número de vezes que o banhista percorria este percurso eram do livre arbítrio de cada um, apesar de médicos como Celsus recomendarem iniciar o banho na sala mais quente e alternar com banhos frios. 

Mas numa sociedade hierarquizada e esclavagista perguntamo-nos: quem podia frequentar as termas públicas? Em princípio todos, desde que pagassem a entrada, valor que na maioria dos exemplos conhecidos era quase simbólico. Sabemos, através de documento legal referente às Minas de Vipasca, proveniente de Aljustrel, que as mulheres pagavam o dobro dos homens no acesso às termas, e que as utilizavam de manhã, enquanto os homens iriam à tarde, no inverno depois da hora quinta e no verão depois da sétima, ou seja, antes de jantar. Na verdade, as termas eram também o local onde a sociedade se reunia, discutia a política ou simplesmente comentava a vida do vizinho, e por isso mesmo o local ideal para se fazer campanha política, que podia passar pela oferta das entradas num determinado dia a toda a população ou de óleo para todos os banhistas, ou de azeite para as lucernae que iluminavam as termas. 

Serviu, nalgumas ocasiões, para transmitir a magnificência do imperador, como no episódio anedótico sobre Adriano, que, visitando umas termas em Roma, encontrou um velho veterano – que reconheceu por ter estado às suas ordens – obrigado a lavar as costas esfregando-as contra o mármore porque não tinha dinheiro para comprar um escravo. O imperador não só lhe ofereceu alguns, como lhe deu dinheiro para os manter, sendo depois relatado que no dia seguinte vários cidadãos se esfregavam pelas paredes das termas na expetativa de receber tão apetecível recompensa. 

Pilar Reis, “As Termas e os Banhos de cada Dia”, in Visão História, “Portugal no Tempo dos Romanos”, setembro de 2012 (adaptado).


A vida quotidiana de um romano na época imperial 


· Os Romanos levantavam-se sempre bastante cedo. O dia começava às 4 e 30 no verão e às 7 e 30 no inverno. Logo depois de se erguerem tomavam o jentaculum, o mata-bicho, que com o tempo viria a ser substituído por um simples copo de água (para «manter a linha»). 

· A manhã era dedicada ao trabalho e às visitas de cortesia. 

· Ao meio-dia tomava-se uma refeição ligeira, chamada prandium; as classes mais baixas faziam-no em plena rua, e em pé. 

· Por volta das 13 e 30 era hora de ir para o balneário; além de constituir uma prática higiénica (estendida a todas as classes sociais, incluindo os escravos), o banho diário era também pretexto para umas horas de agradável convívio. 

· O dia encerrava-se com a ceia (cena), que para as classes privilegiadas se prolongava até à noite. Estes comiam reclinados sobre um cotovelo, na divisão da casa chamada triclinium. Nos banquetes era frequente os convivas vomitarem voluntariamente para em seguida comerem mais.


Imagem ilustrativa - Vinheta de “Asterix Gladiador”

Imagem ilustrativa - Reconstituição de uma «cena».


Calendário – como se contava o tempo

OS ANOS:

· Os Romanos contavam os anos a partir de 753 a.C., data da fundação de Roma. Por isso designavam a sua era por AUC (Ab Urbe Condita, Desde a Fundação da Cidade). 

· O ano com 365 dias foi instituído por César em 46 a.C. (707 AUC). 



OS MESES: 

Os meses tinham os seguintes nomes: 

· Mars – dedicado ao deus Marte; 

· Aprilis – devido à abertura das flores; 

· Maius – ao deus do crescimento; 

· Junius – em honra de Juno; 

· Quintilis – o quinto mês, que passou a julius em 44 a.C., como homenagem a Júlio César; 

· Sextilis – o sexto, que passou a augustus em 8 a.C., em honra de Otávio César Augusto; 

· September – o sétimo; 

· October – o oitavo; 

· November – o nono; 

· December – o décimo; 

· Januarius – em honra de Jano; 

· Februarius – das purificações (februo). 

A ordem foi esta até 153 a.C., passando então o ano a arrancar em januarius; mantiveram-se porém os nomes september, october, november e december (7.º, 8.º, 9.º e 10.º). 


OS DIAS: 

· Cada mês dividia-se em nonas, idos e calendas. As nonas iam dos dias 2 a 7 em mars, maius, julius e october e de 2 a5 nos oito restantes; os idos de 8 a 15 e de 6 a 13; as calendas de 16 ou 14 até ao fim do mês. 

· Os dias eram contados de frente para trás a partir do início das nonas, idos e calendas, por exemplo, ante diem tertium idus («o terceiro dia antes dos idos»). 

· A expressão Ad calendae graecae («para as calendas gregas») designa algo que nunca se concretizará, pois os Gregos… não tinham calendas. 

in “Portugal no Tempo dos Romanos”, Visão História, setembro de 2012.

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