Em 1961, Rómulo de Carvalho (pseudónimo de António Gedeão), publica o livro Máquina de Fogo, do qual faz parte o poema "Lágrima de Preta", que seria musicado por José Niza, e cantado por Adriano Correia de Oliveira, em 1970.
Apesar de a canção ter sido proibida pela censura na altura do início da guerra colonial, o poema permanece um dos mais magníficos hinos à igualdade, sem sinais de negro, nem vestígios de ódio.
Lágrima de preta
Lágrima de preta
Encontrei uma preta
que estava a chorar,
pedi-lhe uma lágrima
para a analisar.
Recolhi a lágrima
com todo o cuidado
num tubo de ensaio
bem esterilizado.
Olhei-a de um lado,
do outro e de frente:
tinha um ar de gota
muito transparente.
Mandei vir os ácidos,
as bases e os sais,
as drogas usadas
em casos que tais.
Ensaiei a frio,
experimentei ao lume,
de todas as vezes
deu-me o que é costume:
Nem sinais de negro,
nem vestígios de ódio.
Água (quase tudo)
e cloreto de sódio.
António Gedeão, "Poemas escolhidos", Lisboa, Sá da Costa, 1997
Um poema que nos remete à ideia de racismo e de ódio que existe entre culturas. "A lágrima de preta" é representativa de toda a humanidade e diz-nos que todas as lágrimas são iguais. Através deste poema, o autor mostra claramente que condena veementemente o racismo e luta pela igualdade de direitos.
Quiz do poema aqui.